49% das pessoas com TEA já fugiram ao menos uma vez
Psiquiatra ajuda a entender as causas desse tipo de comportamento
No último domingo (23), a população de São José dos Campos se mobilizou para encontrar Samuel, uma criança autista de 10 anos, que havia fugido de casa. Mesmo já habituado ao ambiente doméstico e sob vigilância constante da família, ele encontrou uma brecha para sair sozinho. O desfecho foi trágico. Na segunda-feira (24), ele foi encontrado sem vida.
Infelizmente, essa situação é recorrente. Crianças autistas apresentam comportamento de fuga e sem noção do perigo, podem se ferir ou até mesmo falecer.
Mas por que têm esse tipo de comportamento? É possível evitar? Conversamos com o psiquiatra Dr. Alexandre Bassoli para tentar encontrar essas respostas e aprender um pouco mais sobre o autismo.
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) afeta a percepção do mundo e as relações sociais, variando em graus de intensidade entre os indivíduos. Pessoas com TEA apresentam dificuldades na comunicação, interação social, comportamentos restritos e repetitivos, e sensibilidade diferenciada a estímulos. Os sinais são percebidos já na infância, e, embora não exista cura, há tratamentos que ajudam no desenvolvimento das habilidades, como acompanhamento psicológico, psiquiátrico, fonoaudiologia, terapia educacional e intervenções diversas.
Estima-se que existam mais de 2 milhões de pessoas autistas no Brasil. Para pais e cuidadores, em determinados espectros, uma das principais preocupações no cuidado diário é o comportamento de fuga.
Comportamento de fuga
Assim como qualquer pessoa, os autistas possuem o instinto de fuga ou defesa quando estimulados, embora de forma mais exacerbada.
Embora seja mais comum na infância, esse comportamento pode ocorrer em pessoas com TEA em qualquer fase da vida. Na infância, a situação exige mais atenção devido à dificuldade natural de comunicar suas emoções, e a fuga pode ser uma maneira de lidar com a frustração ou a ansiedade.
De acordo com o psiquiatra, Dr. Alexandre Bassoli, “a busca por um ambiente sensorialmente agradável e a curiosidade ou desejo de explorar novidades também podem motivar a fuga. Além de sobrecarga sensorial, mudanças na rotina, frustração devido à dificuldade de comunicação, ansiedade ou estresse emocional e dificuldade com o controle de impulsos.”
O psiquiatra esclarece que “situações de estresse ou mudanças inesperadas podem favorecer esse comportamento ao longo da vida, dependendo das circunstâncias e das necessidades da pessoa.”
Quando a pessoa com TEA foge, ela não tem referências dos perigos que a cercam. É comum que soltem a mão de quem as acompanha e corram para o lado oposto, podem também tentar saltar de um carro em movimento ou abrir portas e janelas que nunca tentaram abrir antes e isso pode acontecer não só em locais novos, mas em ambiente doméstico, onde a pessoa já está habituada a ficar.
Uma pesquisa de uma organização chamada Pediatrics, divulgou que 49% das crianças autistas já tentaram fugir em alguma ocasião, sendo que em 24% dos casos, houve perigo de afogamento e 65% risco de lesões no trânsito. A National Autism Federation também realizou um estudo onde afirma que cerca de um terço dos casos de fuga resultaram em morte ou ainda necessidade de atendimento médico, sendo o afogamento a principal causa no período do estudo (2011- 2016).
“A fuga de uma criança com TEA pode ser um desafio, mas com uma abordagem cuidadosa é possível reduzir esse comportamento e criar um ambiente mais seguro para toda a família. É necessário entender as necessidades da criança e implementar estratégias que favoreçam a sensação de segurança e controle. Estabelecer uma rotina previsível, identificar e reduzir fontes de sobrecarga sensorial, usar estratégias de comunicação eficazes, estabelecer limites claros e consistentes, apoiar a criança em momentos de transição, promover atividades de interesse e engajamento, monitorar e compreender os gatilhos e por fim treinamento para os responsáveis e familiares são algumas ações que podem evitar a ocorrência de fuga.” Explica o psiquiatra.
Como agir ao presenciar uma fuga?
Se a pessoa em fuga ainda puder ser vista, deve ser seguida e chamada pelo nome com calma, evitando assustá-la para que não corra ainda mais. Quem tenta ajudar deve manter a calma e dar comandos firmes, como “pare”, “volte” ou “espere”. É importante alertar as pessoas ao redor e pedir ajuda, especialmente para controlar o trânsito durante o resgate.
Se a pessoa já não estiver visível, deve-se acionar a polícia e as autoridades. Vizinhos e amigos podem ajudar na busca na área.
Entre as precauções estão o uso de cordão de identificação com número de telefone, vigilância constante com portas e portões trancados, janelas com telas fixas e alarmes ativados. Além disso, é essencial conversar com os vizinhos para que saibam como localizar os responsáveis em uma situação como essa.
A prioridade é acolher a criança e compreender as causas desse comportamento, identificar os gatilhos e trabalhar na correção das situações. É fundamental abordar essa questão de forma aberta e conscientizar a comunidade, não apenas a família, para garantir um ambiente mais seguro para a criança ou adulto com TEA.
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